Por Guillaume Faye*
A libertação sexual é um dos grandes movimentos ideológicos
e políticos que agitaram o Ocidente a partir do começo dos anos 1960.
Fortemente ligada ao feminismo político, à dissidência marxista (ou
esquerdismo), e também ao anarquismo libertário, a corrente da libertação
sexual é um bom exemplo de sucesso metapolítico, já que atingiu seus objetivos
– os quais, de qualquer forma, eram parte da tendência dos tempos e talvez
ocorressem de todo modo.
O
movimento de libertação sexual misturou atropeladamente, como se estivesse
completamente descontrolado, todos os seus projetos e objetivos: o fim da
família burguesa, da fidelidade conjugal, da virgindade feminina no casamento,
da predominância heterossexual, liberdade total para a pornografia, abolição de
tabus contra o incesto, pedofilia, e por aí vai. Um grande pot-pourri no qual
Eros está notavelmente ausente: um pot-pourri sem o refinamento dos libertinos.
Valorizar
o prazer acima de tudo, “gozar sem restrições”, dizia o mote anarquista de Maio
de 68. O individualismo mais desenfreado e egoísta estava curiosamente
misturado, especialmente na França, com afinidades pela esquerda coletivista.
Mas aí não havia contradição. Retrospectivamente, podemos ver que a revolução
sexual foi um surto de hedonismo vulgar de origem pequeno-burguesa que queria
se emancipar brutalmente das amarras da moralidade sexual cristã. Com algum
ilusionismo ideológico, a teoria da libertação sexual (a qual também se referiu
frequentemente a si mesma como “revolução sexual”) apresentou-se como a
contrapartida de uma revolta anticapitalista e de um neo-marxismo infantil, uma
pretensão cuja imbecilidade foi demonstrada por Christopher Lasch (de quem eu
falo em outra ocasião), uma vez que o comércio utilizou-se dela como base para
um novo negócio.
Uma ideologia de puritanos
Esta
ideologia tem uma origem principalmente Anglo-Saxã (sobretudo estadunidense) e
Germânico-Escandinava, ou seja, ela vem de um domínio cultural marcado pelo
puritanismo de cunho protestante.
As
pessoas se atiraram de cabeça naquilo que pode ser chamado de sexualismo com uma avidez de iniciantes,
de filisteus. A libertação sexual, portanto, não tem nada a ver com o espírito libertino refinado, erótico e
livre, que em sua liberdade tratava de manter a ordem sem sacrificar o prazer,
o que fazia tão discretamente. Uma certa rudeza germânica, um certo embotamento
de espírito (bem percebido por Nietzsche) que os Estados Unidos herdaram em
parte, percorre todos os movimentos por libertação sexual. Manifestar um desejo
de libertação não equivale, em todo caso, a admitir que no fundo se é
frustrado?
Puritanos
frustrados descobriram o sexo e ficaram fascinados, passando de um excesso ao
outro, da mais tola pudicícia ao mais grosseiro despudor, como crianças que
encontram o pote de geleia proibido e o devoram aos punhados.
Paradoxalmente,
a ideologia da libertação sexual foi mais longe na Europa do que nos Estados
Unidos. Isso porque o vírus ideológico ou cultural originado entre a elite
norte-americana afeta apenas uma pequena parte da população em geral; e isto é
válido em todos os âmbitos. O país das cidades pequenas não é aquele do campus
universitário, nem o de Nova Iorque ou California. Ele continuou puritano,
mesmo que os EUA tenham inventado as Marchas do Orgulho Gay e a indústria
pornográfica.
Mais
de sessenta anos depois, as principais metas da libertação sexual se
introduziram em nossos costumes. Mas dificilmente pode ser dito que os
resultados corresponderam às esperanças. A felicidade universal e a rejubilante
liberdade que supostamente viriam da libertação sexual não se realizaram. O
grande lema da abolição dos tabus foi
às ruas e voltou de mãos vazias – para não dizer que trouxe tabus muito piores
do que os precedentes.
As falsas promessas da libertação sexual
Será
que a libertação sexual produziu os efeitos esperados, aqueles de realização e
de um caminho mítico para o prazer físico e psicológico? Será que nós, como foi
prometido, superamos a repressiva e frustrante prisão da sociedade burguesa e
entramos em um paraíso de liberdade corporal, como o previsto por Wilhelm Reich
e Herbert Marcuse? Certamente não. Na verdade, observamos o oposto – entre as
mulheres, assim como entre os homens. Os
sonhos de emancipação resultaram em alienação.
A
sexualização universal da sociedade triunfou à custa do bem-estar pessoal e da
sexualidade equilibrada. As mídias conectam a sociedade em um gigante universo
sexual virtual, um simulacro feito de imagens e palavras. Esse mundo onírico
consistindo de todas as formas de erotismo – desde a doçura do amor sexual
benéfico e equilibrado até às fantasias orgiásticas da pornografia – virou um
ideal de massa, mas um inferno no nível individual: o imperativo categórico da
satisfação sexual se tornou impossível de atingir. Sonha-se com bolo de
chocolate, mas não existe nenhum bolo de chocolate.
A
este respeito, a indústria pornográfica de imagens (filmes, revistas),
legalizada nos anos 60, e a indústria de encontros eróticos (por telefone ou
via internet) torna-se cada vez mais frustrante para milhões de consumidores
ingênuos, explorados – porque, obviamente, ela praticamente nunca leva a encontros
reais, românticos ou eróticos.
Como
sempre, ao tentar substituir o virtual pelo real, a quimera pela realidade, a
sombra pela forma, a massas crédulas estão sendo manipuladas e levadas à
loucura. O colapso das normas familiares, a retração da cultura da modéstia, a
confusão sexual, sexo adulto colocado em mãos de adolescentes despreparados,
exibição pornográfica transformada em espetáculo de massa – tudo isso não levou
a mais, e sim a menos prazer, não forjou indivíduos mais bem equilibrados, e
sim indivíduos bastante desequilibrados.
Aqui
precisamos ter em mente o intelectualmente brilhante, mas sociologicamente
aberrante, discurso de psiquiatras e filósofos dissidentes freudianos, os quais
reprovavam Freud porque sua solução
edípica visava reforçar a moralidade social e regular o sexo de acordo com
normas sociais. Nos anos 1930, o psiquiatra marxista Wilhelm Reich denunciou o
caráter repressivo da família patriarcal. Vinte anos depois, Herbert Marcuse
criticou o caráter mortificante de “renunciar aos impulsos” e falou a favor de
um tipo de anarquia sexual que colocaria as pessoas no caminho da felicidade e
plenitude. Nos anos 70, a corrente francesa anti-psiquiatria trilhou o caminho
aberto em Maio de 68. Em sua celebrada obra Anti-Édipo,
o “filósofo” Gilles Deleuze e o psiquiatra Félix Guattari defenderam (em termos
que soavam quase como demandas políticas) a morte da família como uma prisão
opressiva e agora obsoleta (bem no mesmo tom que o novelista decadente André Gide).
Eles pregavam a “legitimidade de todo desejo”, mesmo a pederastia, e advogavam
“uma sexualidade polimórfica, eletiva, sem considerar a distinção entre os
sexos”. Obviamente, eles estavam argumentando em favor de suas inclinações
pessoais, mas se esqueceram de que eles próprios haviam sido criados em
famílias estáveis.
Estas
são as raízes intelectuais da confusão sexual com a qual já estamos
familiarizados. Somos golpeados pela ingenuidade, superficialidade e ignorância
sociológica destes “pensadores” celebrados. O procedimento deles era idêntico
àquele de Lysenko: um discurso dogmático desconectado da realidade e ferozmente
hostil à natura rerum [natureza das
coisas].
Não
é só com a miséria sexual, mas também com a pobreza emocional e familiar que
somos confrontados aqui. A liberdade e emancipação individuais parecem
produzir, por uma dramática inversão, o isolamento e encarceramento no
ego.
Mas
a coisa mais extravagante sobre todo este projeto de “libertação sexual” é que
ele não obteve sucesso nem mesmo em definir e sistematizar seus próprios
conceitos. Esta ideologia nem sequer conseguiu, por exemplo, identificar as
ideias centrais de transgressão e perversão. Quão longe poderia ser
levada, exatamente, a libertação individual? Nunca houve nenhuma resposta
clara.
De
fato, se a liberdade sexual devia ser total, se não devia haver mais nenhuma
“norma burguesa”, nenhuma regulação natural, e se a emancipação do desejo
individual devia ter prioridade sobre tudo o mais, por que não permitir
pedofilia, estupro, incesto (já defendido e glorificado pelo diretor de cinema
Louis Malle), bestialidade, tortura ou assassinato por motivos sexuais (temas
recorrentes em Sade, um autor muito admirado pelos teóricos da libertação
sexual), e assim por diante, ad infinitum?
Esta
ideologia mostrou-se incapaz de estabelecer um limite entre o normal e o depravado,
o permitido e o proibido, o aceitável e o nocivo, o lícito e o ilícito. No
mesmo sentido, os ideólogos da libertação sexual também posam como apóstolos
dos Direitos Humanos – o dogmatismo esquerdista exige isto. Mas a contradição é
intransponível: pois a liberdade do desejo sem barreiras, proclamada como um
direito, automaticamente causa danos aos
outros. Isto é ilustrado pela pedofilia, bem como pela propagação da AIDS.
Neste
último ponto, a contradição que mencionei tornou-se clara como o dia; pois
todos sabem que “comunidade” homossexual masculina contribuiu para a explosão
da doença viral, graças ao encorajamento ativo que a homossexualidade masculina
recebeu em todo o Ocidente desde os anos 70. Agora, as associações radicais de
homossexuais (geralmente ligadas à extrema-esquerda trotskista) é que causaram
o maior tumulto a favor do aumento de fundos para pesquisa sobre AIDS, se
opuseram a quaisquer medidas “repressivas” contra a “comunidade” mencionada e se
posicionaram até contra as medidas profiláticas oficiais, descritas como
“discriminatórias”. Parece até que o vírus da AIDS é um tipo de “agente
fascista” que ataca os homossexuais para puni-los. Na realidade, a pandemia de
AIDS é a consequência lógica e direta da ideologia da libertação sexual, e
especialmente da promoção da homossexualidade masculina – para não falar na
irresponsabilidade e no hedonismo anárquico dos homossexuais.
Ao
rejeitar a própria ideia de ordem, esta ideologia se vira contra si própria.
Ela finge defender a harmonia, a liberdade e o fim da opressão, mas acaba
construindo um mundo que opera segundo a lei da selva, a lei do mais forte ou
mais pervertido. As implicações no âmbito político são as mesmas que no sexual:
se o desejo e a liberdade irrestrita consistem em um ideal absoluto, por que
contrariar os impulsos do criminoso ou do tirano? O terrorista não é livre para
satisfazer seus impulsos, assim como o canibal ou o assassino de crianças?
Encontramos
a mesma contradição no que diz respeito a drogas. Nos anos 1960, esta ideologia
considerava usar drogas um direito humano, uma forma de libertação – em suma, o
uso de drogas era considerado na mesma perspectiva que o sexo: um direito individual absoluto ao prazer.
Infelizmente, enormes problemas de saúde pública e criminalidade resultaram do
consumo de narcóticos, problemas sem uma solução clara (como em ambos os casos
da AIDS e da pedofilia). A propagação da AIDS deve muito à tolerância
desenfreada do fenômeno “gay”. Esta ideologia emancipatória carece
completamente de qualquer princípio de
responsabilidade. Em todos os domínios, suas promessas de felicidade
resultam em infelicidade, uma infelicidade pela qual obstinadamente se recusa a
assumir responsabilidade. E, ainda assim, esta ideologia pseudoemancipatória
dominante continua a impor seu igualitarismo injusto e hipócrita em nome de uma
libertação de araque – ela continua com a totalitária e impiedosa repressão de
todos aqueles que não seguem seus erros.
Por
seus excessos, por seu insensato e profundo equívoco sobre a psicologia humana,
a ideologia da libertação sexual corre o grave risco de trazer à tona aquilo
contra o que originalmente se rebelou: ela provoca um renascimento do
puritanismo bronco como forma de reação. Ela está provocando um contra-ataque,
uma repressão sexual real muito mais séria do que aquela suposta repressão
burguesa. A intrusão massiva do Islã na Europa, com sua comitiva de mulheres
subjugadas, seu obsessivo e rigoroso disciplinarismo, separação dos sexos e
machismo, é um sinal perturbador do balanço do pêndulo. Na França, já é
crescente o número de moças – majoritariamente de origem imigrante, claro, mas
não apenas – que estão tendo seus himens recompostos para “recuperar sua
virgindade” antes do casamento. Nós viemos parar bem longe dos devaneios de
libertação sexual.
A ilusão dos encontros virtuais
O
rebento da revolução sexual e também da internet é o crescimento explosivo de
“websites de namoro” (80 por cento orientados para o sexo, os outros 20 por
cento explicitamente pornográficos) e redes sociais. Estes mecanismos
substituíram o modelo tradicional de encontros diretos e conquista de
parceiros, e teoricamente eles oferecem múltiplas oportunidades para relações
de todo tipo. Entretanto, os resultados são decepcionantes. Por que?
Porque
o virtual nunca poderá substituir o real.
Os sites
de internet (Facebook, Meetic, e milhares de outros) baseiam-se em sexo de
segunda-mão, virtual e simulado através de uma tela. O primeiro encontro não é
natural, ele ocorre na solidão, em frente de um sistema mecânico e tudo o mais
vem daí. O diálogo em frente à tela falsifica e desencaminha o resto da
relação, porque ele suprime a emoção
direta do primeiro encontro e estabelece o relacionamento sobre mentiras,
mesmo que elas sejam involuntárias. O acaso do primeiro encontro – em um bar,
numa festa, um escritório, ou na casa de um amigo – é substituído por um
esforço calculado em frente a uma fria tela de dispositivo eletrônico. A
imaginação suplanta a realidade. Romantismo ou desejo são transmitidos por meio
de arquivos de computador. Psicologicamente, um contato recebe um certo viés se
ele é originado por meio de uma busca online. Se depois você chega a encontrar
a pessoa, entende rapidamente que ela não corresponde ao personagem eletrônico
com o qual havia conversado.
Ademais,
o tempo que se passa tentando encontrar um companheiro na internet é gasto em
detrimento de formas humanas de conquista mais antigas e concretas, menos
racionalizadas, mas mais efetivas. Relações emocionais e sexuais elaboradas
virtualmente não têm nem a densidade, nem o sabor carnal da sedução real. Aqui,
novamente estamos atestando os desdobramentos de uma falsa libertação sem
efeito real. A sociabilidade virtual via internet tem quase tanta profundidade
quanto uma tela plana.
Além
disso, são a simulação e as mentiras que caracterizam estas relações, antes de
tudo por causa do embuste geral inerente a todos estes sites “picantes” que
incitam seus usuários a fantasiar sem que essas fantasias resultem em qualquer
coisa concreta, já que os objetivos de tais sites são comerciais. O mesmo vale
para todos os incontáveis números de “disk-sexo”. A maior parte dos homens e
mulheres que (frequentemente disfarçados) clicam e navegam por estes sites não
tem intenção de encontrar ninguém realmente, mas apenas de se distrair em
frente às suas telas de computador. A fria mediação da máquina cumpre o papel
de manter as pessoas longe da ação na vida real.
A combinação de
libertação sexual e internet teve o efeito oposto ao que era almejado: ela
simplesmente aumentou a solidão sexual. Os bares estão se acabando ou fechando as
portas cada vez mais cedo; salões de dança e discotecas estão definhando (os
clubes noturnos são hoje cinco vezes menos comuns na França do que em 1980),
agências matrimoniais estão encerrando atividades, e por aí vai. Lugares reais
para paquerar e socializar estão gradualmente perdendo espaço para uma busca vã
e ansiosa, na qual cada indivíduo está sozinho na frente de uma tela
contemplando uma cena com tanta solidez quanto um fantasma: isto é a libertação
sexual.
O texto acima
é um excerto do livro de Guillaume Faye “Sex and Deviance” (Publicado em inglês
pela Arktos, em 2014).
*Sobre Guillaume Faye:
Guillaume
Faye nasceu em 1949 e recebeu seu Ph.D. em Ciência Política do Institut d’Études
Politiques de Paris. Ele foi um dos principais organizadores do grupo da Nova
Direita Francesa GRECE (Groupement de Recherche et d’Études pour la Civilisation
Européenne) durante os anos 70 e 80, e ao mesmo tempo cultivou sua carreira
como jornalista, particularmente nas revistas de notícias Figaro e Paris-Match.
Em 1986 ele deixou o GRECE após um desentendimento com a direção do grupo. Por
mais de uma década, trabalhou como locutor para estação de rádio francesa Skyrock, e no programa Telematin que ia ao ar na France 2 TV. Ele voltou ao campo da
filosofia política em 1998 quando vários de seus novos ensaios foram reunidos e
publicados no volume “Arqueofuturismo”. Desde então, ele produziu uma série de
livros que tem desafiado e revigorado leitores por todo o mundo.
Fonte: Right On